Bases para o diálogo da Física Quântica com as Filosofias Espiritualistas e a Psicologia Transpessoal – Parte 1

Autora: Maristela A. André

Observação: Este texto está dividido em três partes! Confira as demais partes.
Maristela A André, S Paulo (revisto em maio/2001)

ÍNDICE

1. INTRODUÇÃO

2. A TEORIA DA INCERTEZA

3. O OBSERVADOR E O OBJETO OBSERVADO (ver parte 2 do texto)

4. A CAUSAÇÃO DESCENDENTE (ver parte 2 do texto)

5. O MUNDO QUÂNTICO DA MENTE (ver parte 3 do texto)

Este texto tem por objetivo apresentar algumas das contribuições da física quântica que se constituem em portas importantes para o diálogo entre, de um lado a ciência, do outro a psicologia transpessoal e as filosofias espiritualistas.
É baseado no trabalho de Amit Goswami(*1), físico teórico e professor da Universidade de Oregon-USA, atualmente pesquisador da Noethic Society-USA.

Em dezembro de 1900, data considerada como o marco da mutação da Física Newtoniana para a Física Quântica, Marx Planck apresentou, num Congresso de Física, os dados de sua experiência com corpos negros irradiados que emitiam calor em pequenos pacotes e não de maneira contínua como era de se esperar pelas leis de Newton. Planck chamou cada um desses pacotinhos de calor de um “quantum” de energia, ou seja, uma quantidade indissociável. Plank, de formação newtoniana, não encontrou explicação para o resultado de sua experiência e apelou para os colegas, a fim de interpretá-lo.
Esse foi o ponto de partida da Física Quântica, que viria a manter uma influencia profunda sobre a visão de mundo emergente no decorrer do século XX.
Sua influencia foi tal que muitas outras áreas de conhecimento de práticas humanas passaram a utilizar-se do qualificativo “quanta”. Vemos a todo o momento, expressões tais como; medicina quântica, cura quântica, Ser quântico… A física quântica está repleta de termos que passaram a serem usados na vida diária. A teoria de incerteza dos corpos, de Heizenberg, invadiu a linguagem de áreas de conhecimento como da sociologia e da psicologia, a idéia de salto quântico passou a ser utilizado para expressar uma mudança rápida e significativa na vida de uma pessoa em algum processo qualquer.

O termo popularizou-se através de artigos em revistas e mesmo jornais, de tal forma que foi incluído no vocabulário das pessoas, muitas vezes sem levar em conta seu verdadeiro significado; por detrás do modismo, porém, existem conteúdos capazes de revolucionar as crenças, valores e hábitos mentais de todas as sociedades humanas neste fim de século.

No nosso cotidiano interpretamos o mundo pela visão da física clássica e ela nos parece ser suficiente: a realidade visível se apresenta como estruturada, suficientemente estável, a maioria dos acontecimentos é previsível, a racionalidade é a qualidade da mente que mais utilizamos para o acesso ao conhecimento técnico – científico e para a vida social, especialmente no ocidente.

A estranheza com a física quântica é percebida inclusive por seus criadores, como o físico Niels Bohr, quando disse certa vez: “os que não ficam chocados quando tomam conhecimento da teoria quântica não podem, possivelmente, tê-la compreendido” .
Para podermos entender com clareza a inovação trazida pela física quântica, é essencial antes explicitar com mais precisão as convicções crenças e valores da física clássica, liderada por luminares como Newton, Maxwell e tantos outros e que se estenderam até mesmo a visões subjacentes à teoria da relatividade de Einstein:


· Objetividade e determinismo: obedecendo às leis da física, as interações entre objetos causam todos os movimentos desses objetos; se conhecermos as condições iniciais em que se encontram os objetos (o que é essencial para defini-lo), podemos determinar seu movimento em qualquer instante de tempo;

· Continuidade: todo movimento é contínuo no tempo, portanto previsível; as incertezas eventualmente existentes serão superáveis com o progresso da ciência;

· Causalidade: existe sempre uma relação de causa e efeito entre os fenômenos de âmbito científico, obedecem a um processo de causação ascendente, ou seja, a relação de causalidade se dá das partes para o todo, do nível mais elementar para o mais complexo;

· Localidade: a relação de causa e efeito funciona mediante a interação local, o que significa que ocorre por intermediação material ou eletromagnética entre o agente causal e o objeto sobre o qual exerce o efeito e, ainda mais, que os sinais mediadores atravessam o espaço em um intervalo finito de tempo;


· Monismo materialista (filosofia implícita nas hipóteses básicas da física clássica): todo e qualquer fenômeno subjetivo, tal como os fenômenos do âmbito interno da mente humana e a idéia de auto consciência, em si mesma, são derivados da matéria (o cérebro) e, como tal, não tem nenhuma eficácia como fator causal. Esta afirmação é decorrência natural das anteriores e consiste no realismo científico, para o qual consciência no homem, bem como Consciência Universal ou Deus são hipóteses desnecessárias e estranhas ao âmbito da realidade científica; admite que todos os fenômenos de causa e efeito são sempre internos à realidade considerada cientifica.
Mesmo as ciências humanas, a exemplo da psicologia, sustentam seu status científico pela aceitação implícita de que os processos da mente são gerados pelo cérebro, sejam eles racionais, intuitivos como emocionais; a hipótese da existência de fenômeno causal de natureza espiritual é excluída como inexistente nos processos da mente humana.
Passamos a apresentar sinteticamente as convicções da física quântica importante para o novo diálogo com a psicologia transpessoal e as filosofias espiritualistas:

· A realidade subatômica é dual, é onda de possibilidades e partícula, é virtual e imanente simultaneamente, o ser e o não ser coexistem dinâmica e permanentemente.

· A descontinuidade, a incerteza e a imprevisibilidade são intrínsecas ao comportamento da realidade;

· A impossibilidade do acesso do homem ao conhecimento pleno e inequívoco da realidade pela ciência é intrínseca, insuperável;

· O conhecimento científico é influenciado pela subjetividade do observador na percepção da realidade, tornando a mente do observador co criadora da realidade;

· Existe interinfluência mútua entre observador e objeto observado e entre quaisquer objetos do mundo sub atômico, todos os componentes do universo são elementos de uma única realidade dita entrelaçada, interdependente, formando um todo dinâmico e indivisível;

· O modelo holográfico de visão do universo, defendido por físicos quânticos, leva a valorizar a abordagem do todo para estudar seus componentes, cada um dos seus elementos contém o todo, esse modelo leva o pesquisador à percepção do sincronismo entre específicos eventos e o todo;

· Físicos quânticos reconheceram a comunicação direta e instantânea entre mentes, sem a interveniência de causas aceitas como cientificas. (*2)

· A física quântica constatou a existência de processo de causalidade descendente, em contraposição com a hipótese adotada pela física clássica, da causação exclusivamente ascendente, inclusive por ação de um agente causal externo ao âmbito da realidade de um experimento científico, tal como pela presença consciente do observador;

· Os físicos de opção filosófica monista idealista admitem que o fator causal da causação descendente não seja apenas a mente do homem, mas a Consciência no homem, atuando como representante do fator causal último que é a Consciência Universal.

· Ao invés da matéria ser considerada a realidade primária ou última, a Consciência Transcendente e Universal é a base de todo o ser, o cérebro e a mente são derivados dela.
A Consciência Universal é auto referente, criadora, harmonizadora, unificadora da realidade.

· A evolução do ser humano consiste no desenvolvimento de sua capacidade de se tornar um canal aberto à Consciência Universal, ampliando assim a Consciência Individual. Tal evolução lhe permite tornar-se co-criador da harmonia universal.

Passamos a apresentar o conteúdo e a gênese destas convicções dos físicos quânticos, a mostrar as contribuições para a visão do homem ocidental e ainda a indicar como contribuem para o diálogo com filosofias espiritualistas e com psicologias transpessoais.

Aos leitores que desejarem maior detalhamento na exposição dos experimentos científicos deste capítulo, das teses dos cientistas e de suas controvérsias, aconselhamos a recorrer à bibliografia citada ao final do capítulo e a outras correlatas.


2. A TEORIA DA INCERTEZA
O

salto quântico

Observaram os físicos que um elétron, sob a forma de partícula, ao girar em torno do núcleo do átomo, passa instantaneamente de uma órbita à outra quando ganha ou perde energia. O fato contradiz a lei definida por Einstein, pela a qual a velocidade máxima do deslocamento dos corpos é a da luz.

A interpretação dos físicos foi a de que o elétron, ao trocar de órbita, não se comporta como partícula, mas como onda de probabilidades de existir em dado instante, num determinado ponto do espaço ou numa determinada órbita.
Note-se que, na condição de onda de probabilidades, o elétron pode estar presente em uma ou mais órbitas simultaneamente.



O fenômeno do deslocamento instantâneo do elétron foi chamado de “salto quântico”, o uso do conceito de “salto” se deve a que o elétron não percorre fisicamente o intervalo entre órbitas. Ao reaparecer como partícula os físicos dizem que houve um “colapso” do elétron(*3).

O fenômeno indica a condição onda-partícula do objeto quântico, a descontinuidade e a imprevisibilidade do comportamento do elétron. A natureza dos entes sub atômicos é assim reconhecida como dual, simultaneamente onda e partícula:

Desde as primeiras décadas deste século constatou-se que as partículas sub atômicas, a exemplo de elétrons e fótons, em certas experiências obedeciam às leis do movimento, da física clássica se comportando como uma partícula, como no experimento do efeito foto elétrico, outras vezes apresentam comportamento típico dos fenômenos ondulatórios, como em experiências de difração, o que levou à conclusão de que o elétron se apresenta às vezes como onda e outras como partícula, segundo o modo de observação.

O conhecimento da realidade pela ciência é intrinsecamente incerto. Heisenberg, cientista expoente da formulação da teoria quântica, disse que “o que observamos não é a natureza em si mesma, mas é esta enquanto exposta o nosso modo de observá-la.”
A nível sub atômico, a teoria da incerteza mostrou que quanto mais precisamente conhecemos um aspecto da realidade, menos podemos conhecer de outro igualmente essencial.


Max Born outro físico dos que conceberam a física quântica, constatou que sempre que um foco de luz é dirigido a uma partícula sub atômica, que passou a ser denominada objeto quântico, perde-se a possibilidade de, naquele instante, conhecer também sua velocidade e o seu momentum (dado pelo produto da velocidade com a massa do objeto); concluiu que não é possível conhecer o conjunto completo de características necessárias para a plena definição do objeto quântico por suas características essenciais; em decorrência não é possível a previsão do seu comportamento.

Neils Bohr, físico quântico, demonstrou que natureza dual da onda de possibilidades-partícula, é de complementaridade, é inseparável, e que é impossível detectar simultaneamente estas duas formas de ser.


Notemos que as idéias até aqui expostas já contrariam profundamente a visão da física newtoniana; negam, por exemplo, a continuidade dos fenômenos, a previsibilidade e a objetividade do conhecimento científico.

A próxima frase permite notar como tinha razão o físico Niels Bohr sobre o choque das descobertas da física com nossas convicções mais arraigadas.

As ondas referidas como base da realidade sub atômica são ondas de probabilidades de existir, são apenas tendências no espaço-tempo, realidades virtuais. Assim sendo, a realidade quântica é dual, virtual e material simultaneamente, é o ser e o não ser coexistindo dinâmica e permanentemente.

Uma das inferências que tem sido feitas a partir da constatação do salto quântico é de que ele caracteriza não só a incerteza, mas também a oportunidade, dando espaço para a admissão de que no comportamento da natureza ocorram atos criativos; mais adiante neste texto se verá que físicos quânticos passaram a admitir a ocorrência, inclusive, de atos criativos por interferência do homem e até mesmo de fatores que transcendem a mente humana.

*1 – Amit Goswami, Ph.D., é professor titular de física quântica do Instituto de Física Teórica da Universidade do Oregon -EUA. É físico nuclear teórico, pioneiro na interpretação idealista da física quântica. Autor dos livros: (1)Quantum Mechanics, (2) Spirituality, a Quantum Integration; (3)Science within Consciousnes; Physics of the Soul: Death an Reincarnation in the Quantum World; (4)Quantum Creativity e livro traduzido para o português: (5) O Universo Auto-Consciente: como a Consciência Cria o Mundo Material. (Ed. Rosa dos Tempos, RJ.,1998). Item 1 da bibliografia (pg. 99)

*2 – Fenômenos como estes são denominados “não locais”, o que significa que ocorreram sem comunicação (conecção material nem eletromagnética) entre as pessoas e ainda não obedece ao limite temporal da velocidade da luz (são instantâneas).

*3 – Foi realizado um experimento no qual inúmeros detectores (contadores geiger) foram espalhados pelas áreas em que o elétron teria probabilidades significativas de surgir como partícula “colapso do elétron”. Revelou que, num dado instante, apenas um detector registra a sua presença e nesse momento a probabilidade de emergir em outro ponto qualquer se anula imediatamente

Bases para o diálogo da Física Quântica com as Filosofias Espiritualistas e a Psicologia Transpessoal – Parte 2

Autora: Maristela A. André

Observação: Este texto está dividido em três partes! Confira as demais partes.
Maristela A André, S Paulo (revisto em maio/2001)

ÍNDICE

1. INTRODUÇÃO

2. A TEORIA DA INCERTEZA

3. O OBSERVADOR E O OBJETO OBSERVADO (ver parte 2 do texto)

4. A CAUSAÇÃO DESCENDENTE (ver parte 2 do texto)

5. O MUNDO QUÂNTICO DA MENTE (ver parte 3 do texto)

3. O OBSERVADOR E O OBJETO OBSERVADO

O notável físico John Von Neuman, provou que o ponto crítico da transição onda – partícula não se encontra dentro do aparelho de medida e só pode estar em etapa posterior, que ocorre na decodificação visual do observador. Ao nível macroscópico pode-se fazer uma analogia com a percepção humana de uma imagem de televisão: ondas eletromagnéticas portadoras das imagens fluem livremente no ar, são sintonizadas por um televisor e o telespectador as percebe pelos sentidos da visão e audição, o cérebro registra a informação e a mente a decodifica, portanto a realidade final dependeu do observador. 

O evento citado como constatação do papel decisivo do observador no resultado de um experimento científico é referido como o da fenda dupla.

Um feixe de elétrons foi emitido por uma fonte luminosa e travessou simultaneamente dois orifícios indo sensibilizar uma tela fluorescente adiante. Constatou-se pelo espectro registrado na tela que, na ausência de um observador, os elétrons do feixe apresentaram padrão de interferência próprio das ondas luminosas que atravessaram os orifícios. 
Sempre que o observador esteve presente, porém, os elétrons se comportaram como partículas impressas na mesma tela; a atenção focada do observador provocou o colapso (termo usado pelos físicos) das ondas de probabilidades em partícula.

Sobre este experimento cabe citar ainda outras formulações importantes, corroboradas e complementadas por outros experimentos: um objeto quântico só pode ser conhecido em termos relativos aos instrumentos de medição e ao observador e, ainda mais, inexiste independência entre o observador e o objeto observado, ambos influenciam-se mutuamente, participam todos de um sistema entrelaçado, a realidade é sempre interdependente. David Bohn físico colaborador de Einstein, considerou ser melhor “virar a física de cabeça para baixo; ao invés de começar por partes discretas, até as mínimas, como átomos e partículas elementares, e mostrar como elas se relacionam e funcionam junta, deveríamos começar pelo todo”. Admite que as unidades discretas do universo estão ligadas intimamente a um nível profundo, formam um todo indivisível. Ondas de probabilidades formam uma rede cósmica de freqüência aonde existe uma ordem, uma estrutura dinâmica implícita, não manifesta no nosso modo normal de perceber a realidade. Muitos físicos quânticos passaram a admitir que a realidade se comporta segundo um modelo holográfico, cujas implicações veremos a seguir.

Num filme holográfico a distribuição da informação permeia todo o sistema, de tal forma que cada parte contém a informação de todo; se ampliarmos uma pequena parte de um corpo registrado num filme holográfico, ao invés de encontrarmos a foto daquela parte expandida encontramos a reprodução do corpo todo. Tal propriedade existe também no cérebro humano e este atua como um holograma interpretativo do Universo Holográfico. No enfoque do paradigma holográfico, além da focalização de todo, há a percepção intuitiva da rede dinâmica e interligada na qual eventos específicos e localizados repercutem no todo e vice-versa, sincronismos são inerentes ao funcionamento da realidade, vista pelo modelo holográfico.

Para os espiritualistas é uma agradável surpresa o que a física quântica está admitindo, e não surpreende, por exemplo, as filosofias espiritualistas e culturas como a indiana, para a qual Maya ou ilusão é a forma pela qual percebemos o mundo, essa percepção é produto da nossa mente, o conhecimento da realidade última transcende a nossas possibilidades. Também o filósofo grego Platão, no conhecido mito da caverna diz que o que o homem vê é uma sombra da verdadeira realidade, mera aparência, projetada pela mente humana nas paredes da caverna.

O mundo quântico nos aponta as falhas do paradigma científico a que estão condicionadas nossas crenças, valores, modos de pensar e aponta para uma nova visão que possa um dia nos aproximar de uma realidade mais fundamental. Enquanto a visão da física clássica nos afasta da percepção da integração corpo, mente e espírito, a quântica nos aponta para a necessidade de uma visão integradora da realidade da natureza e do homem, em suas múltiplas dimensões e até mesmo aponta para a hipótese da existência de uma Consciência Universal, como veremos a seguir.

4. A CAUSAÇÃO DESCENDENTE

Retomando um ponto importante já apresentado: com base no “experimento da fenda dupla”, os físicos quânticos constataram a existência do fenômeno da causação descendente até mesmo por fonte causal externa ao universo do fenômeno físico. A mente humana foi identificada como sendo a fonte causal externa que, focando o “experimento da fenda dupla” determinou o colapso da onda (realidade potencial) em partícula, realidade imanente (matéria).

Um experimento com dois observadores vindos ao mesmo tempo de direções distintas num cruzamento de ruas, com semáforo, levaram os físicos à formulação da hipótese de que a harmonização das visões dos dois acerca da ocorrência de apenas uma das possíveis leituras do semáforo se dava pela existência de uma fonte harmonizadora que transcende à mente de ambos.

Outra pesquisa no âmbito do corpo humano mostrou que a intercomunicação dentro do cérebro humano se processa a partir de sinapses neurológicas e segundo Harris Walber, o fenômeno não é de natureza química (como outros pesquisadores admitem), mas sim um processo elétrico possibilitado pela abertura da fenda sináptica é ocasionado pela formação de um “túnel quântico” que permite o salto quântico dos estímulos de um neurônio ao outro. Neste caso o fator causador externo do salto quântico não pode ser um observador humano, deve ser alguma outra a fonte externa ao sistema cérebro-mente.

Pesquisas feitas pelos físicos L. Bass (australiano) e Fred A. Wolf (norte americano) evidenciaram que, mesmo a nível macroscópico, ocorre a interferência de uma frente causal externa na ocorrência de fenômenos físico-mentais. Observaram que o funcionamento da inteligência no homem exige, além da ocorrência das sinapses neurológicas entre neurônios contíguos, que o acionamento de um neurônio seja acompanhado pelo acionamento instantâneo de outros que se encontram a distancias macroscópicas do mesmo. 

Ficou evidenciada a presença de um fator causador externo e “não local” capaz de atuar na intercomunicação neuronal a distâncias macroscópicas e capazes de harmonizar instantaneamente a atuação de múltiplas áreas do sistema cérebro-mente (sistema de natureza fisico-mental).

Diversas experiências, repetidas por pesquisadores em diferentes países, colocaram duas pessoas para meditar juntas sobre a tese de que “nós dois somos um”, a seguir cada uma foi isolada em câmaras elétro – magneticamente isoladas, para garantir o completo isolamento científico entre as pessoas. Cada uma foi conectada a sensores elétricos e seu movimento cerebral foi acompanhado; numa das participantes provocaram-se estímulos que foram registrados por um elétro encefalograma; os mesmos estímulos foram observados simultaneamente no elétroencefalograma da outra pessoa. Verificou-se um índice elevado coincidência, tanto de potencial, como de fase e de amplitude. O fenômeno foi também considerado de não localidade (na terminologia dos físicos ) . 

Testes de controle foram repetidos com pessoas que não realizaram a meditação prévia e a coincidência dos registros cerebrais foi desprezível, confirmando as conclusões do experimento.

Diante dessas experiências os físicos concluíram:

· Existem fenômenos “não locais” por fator externo ao experimento e externo à interferência consciente do observador humano. Esses fenômenos existem inclusive ao nível macroscópico.

· Existe de fato comunicação entre mentes, sem interveniência de qualquer veículo de comunicação reconhecido pela ciência e ela não obedece às leis da física, ocorre sem concurso de veículo energético ou material e é instantânea.
· A harmonização consciente das mentes das pessoas exerce efeito determinante na comunicação entre elas e na convergência de suas percepções sobre a realidade;
· Deve haver uma fonte superior harmonizadora das mentes e que as transcende.
· A partir das conclusões anteriores, experimentos acerca de fenômenos transpessoais passaram a receber do físico status potencialmente científicos, dentre eles os de telepatia, percepção à distância, experiências fora do corpo.

A admissão da existência de causação descendente afasta a visão da física quântica da visão da física clássica em múltiplos sentidos, até mesmo com implicações de natureza tecnológica. 

Os físicos clássicos, como já foi dito, vêem a matéria como a única geradora dos fenômenos ao âmbito da física; fatores exógenos, a exemplo do pensamento, vêm do cérebro, o gerador da mente do homem. A corrente filosófica funcionalista admite que a mente funciona como um software de um computador e o cérebro como o hardware; para estes a consciência do homem é inexistente ou irrelevante. Os materialistas funcionalistas preconizam a construção de maquinas pensantes capazes de desenvolver todas as aptidões humanas (a exemplo das “Turing Machines”) . 
Para os físicos quânticos a mente não é derivada do cérebro e o sistema cérebro-mente é visto como um sistema emaranhado, sua resolubilidade depende da interferência de um fator externo ao sistema, o que pode vir a tornar impossível sua reprodução em maquinas pensantes. Mais adiante trataremos das propriedades do sistema emaranhado cérebro-mente.

As reflexões sobre a causação descendente levaram a que físicos de opção filosófica monista idealista fossem mais além, admitindo que a mente de um observador seja apenas um instrumento de causação descendente dos fenômenos da realidade. A Consciência Individual é canal da Consciência Universal. Apenas tal hipótese, segundo os físicos monistas idealistas, permite uma interpretação consistente de descobertas científicas que permaneciam antes inexplicáveis.


A Consciência Universal é por eles considerada como ente auto referente, transcendente à realidade, fonte última da criação e do conhecimento, una, indivisível, integradora da realidade universal. Goswami nos diz no seu livro (pg 203 do item 1 da bibliogr.) que:

“A consciência no homem tem que ser um fenômeno não local “(transcendente) “para que seja possível a ocorrência de fenômenos da mente tais como criatividade, amor, liberdade de opção, percepção extra sensorial, experiência mística, visão expressiva e evolutiva do mundo, compreensão do seu lugar no universo.”

Ao afirmar tais idéias ele se apóia na filosofia modista idealista. Para Amit Goswami, a Consciência Universal é a base do Ser “Consciousness is the Ground of Being”, é a realidade ultima, a mente e o corpo são derivados (epifenomenos) da Consciência.

Pela filosofia Vedanta, mente, corpo são realidades ilusórias (maya). Tal visão é compatível com o que Platão apresentou no mito da caverna, o que vemos é uma sombra do real projetada nas paredes da caverna. A mente filtra o real através de sistemas de representação implícitos, baseados em arquétipos, o que provoca um reducionismo qualitativo da verdadeira realidade, a rigor inacessível para a mente humana.

A Consciência Cósmica atua através da Consciência Individual do homem e lhe confere a capacidade do livre arbítrio. O livre arbítrio vem acompanhado da responsabilidade em exercê-lo, em escolher, confere ao homem a qualidade de ser co criador da realidade. 
Segundo esta visão filosófica, a Consciência é a única fonte criadora, é criadora e harmonizadora do universo e de todos os níveis vibratórios que constituem o ser humano, a saber: o mental, o emocional ou vital e o físico; estes são autônomos entre si.

Bases para o diálogo da Física Quântica com as Filosofias Espiritualistas e a Psicologia Transpessoal – Parte 3

Autora: Maristela A. André

Observação: Este texto está dividido em três partes! Confira as demais partes.
Maristela A André, S Paulo (revisto em maio/2001)

ÍNDICE

1. INTRODUÇÃO

2. A TEORIA DA INCERTEZA

3. O OBSERVADOR E O OBJETO OBSERVADO (ver parte 2 do texto)

4. A CAUSAÇÃO DESCENDENTE (ver parte 2 do texto)

5. O MUNDO QUÂNTICO DA MENTE (ver parte 3 do texto)

 

5. O MUNDO QUÂNTICO DA MENTE

A consciência individual é egóica*, por ela a pessoa identifica a si mesma como única e ilusoriamente se percebe como ente separado do universo. Ela é a projeção da Consciência Universal na dimensão individual do homem. 

Quando a atenção consciente do homem, num experimento de física quântica, provoca o colapso da onda de probabilidades (realidade potencial) em partícula (realidade imanente), o homem escolhe um resultado para a medição (partícula), mas permanece inconsciente de que de fato fez uma escolha e é inconsciente da sua interdependência em relação ao objeto observado.

É a Consciência Unitiva que atua sobre o sistema cérebro-mente do homem e produz o colapso onda-partícula e a consciência individual interpreta o resultado dessa intervenção, com base no seu sistema de representações que é apenas um mapa limitado e não a própria realidade. A realidade externa parece ser concreta, sólida e independente dele, o que é uma ilusão, maya, na filosofia Vedanta. 

A Consciência Una momentaneamente se identifica com a do sujeito observador, o que provoca nele a percepção de si como diferenciado do objeto observado, lhe dando a sensação de “eu existo” como ente autônomo, ignorando a interdependência em que se encontra. A ilusão de separatividade dá ao homem o sentido de “ego” *, conceito cunhado por Freud. Percebe-se como separado do objeto observado, do mundo ao redor. Ainda neste texto veremos como o homem evolui no sentido de sair dessa ilusão de separatividade, adquirindo consciência de sua integração num universo interdependente e holográfico (em que as partes são o todo, o todo é as partes).


Segundo Goswami, se não houvesse a intervenção da Consciência, agente externo ao sistema (observador-objeto observado), não haveria colapso da onda em partícula, não haveria medição, pois o sistema cérebro-mente, dual, é parcialmente clássico (mensuralidade é qualidade da física clássica) e parcialmente quântico (capaz de descontinuidade, de salto quântico), mas é um sistema emaranhado ou entrelaçado, de resolução lógica impossível.


Um sistema entrelaçado ou emaranhado é sempre paradoxal, está condenado a uma perene retro alimentação, a exemplo da frase “eu sou mentiroso”. Ao buscarmos o significado da frase vemos que o sujeito define o objeto, mas não nos permite uma conclusão pois o objeto, por sua vez, redefine o sujeito. Outro exemplo de sistema entrelaçado é o do desenho de M. C. Escher de duas mãos pintando simultaneamente uma à outra. Quem pinta quem? 

Dentro do quadro o sujeito (a 1a mão) recria o objeto (a 2a mão) e este cria o sujeito. A solução do paradoxo está fora do sistema, é Escher, o pintor, que pinta a ambas. Segundo Amit Goswami, tal fenômeno ocorre também no sistema interativo cérebro-mente. Sem a medição (pelo cérebro), o sistema não existe e sem a percepção atenta (pela mente) também não. A Consciência Una cria o colapso no sistema cérebro-mente,dá a oportunidade da opção (realizada pela mente), do registro (no cérebro) e de sua interpretação (pela mente).

OS OBJETOS DA MENTE

Cientistas quânticos admitem que os “objetos da mente” tem as propriedades dos objetos quânticos. Objetos da mente são os pensamentos e as imagens aos quais a mente confere significados, sendo estes significados subjetivos. O valor dos objetos da mente é dado pelo significado subjetivo que a mente lhes atribui; tem o padrão comportamental de ondas de probabilidade.

Físicos admitem ser a realidade da mente continua, una, indivisível, holográfica e assim compatível com a percepção da realidade quântica, compatível com aquela atribuída à Consciência Universal, com a qual a mente pode se identificar, através da expansão da auto consciência, especialmente em estados de meditação.

Os pensamentos e imagens são experiências interiores, subjetivas, da mente. Tanto nos estados de vigília como nos de sonho os objetos de observação da mente existem e são relevantes.

A CONSCIÊNCIA INDIVIDUAL COMO CANAL DA CONSCIÊNCIA CÓSMICA

Examinemos mais detidamente como se dá a intervenção da Consciência Unitiva, criando os colapsos da realidade potencial para a imanente através da mente humana, veremos ainda a conseqüência disso sobre a Consciência individual.

Cada vez que ocorre uma experiência de colapso no sistema cérebro-mente, um registro de ocorrência acontece e fica impresso no sistema. Uma sucessão de registros vai constituindo a memória. Essa memória vai criando uma predisposição, um enrijecimento no sistema cérebro-mente. Desse modo perante um estimulo novo, com características animicamente semelhantes àqueles registrados na memória, o sistema tende a dar respostas semelhantes. 


O conjunto de memórias acumuladas no sistema cérebro mente vai, ao longo do desenvolvimento histórico da criança ao adulto, construir o ente que Freud chamou de ego. 


Ego é o ente pelo qual a pessoa identifica a si mesma como única e separada de qualquer outra pessoa e da natureza. Goswami se refere também ao ego como “a imagem que formamos do experienciador aparente de nossos atos, pensamentos e sentimentos no dia a dia”(pg 239 item 1 da bibliografia). Estas memórias criam formas e são guardadas no inconsciente individual (identificado por Freud) como também no inconsciente coletivo (identificado por Yung). Neles se encontram inclusive, memórias dolorosas e amedrontadoras que o ego procura reprimir.

Segundo Goswami (pág.245)1 ” se o sujeito é condicionado a evitar certos estados mentais, cria-se uma probabilidade esmagadora de que estes jamais sofram colapso, em novas experiências, porém os estados de ansiedade provocados pela restrição freqüentemente influenciam, sem causa aparente, a emergência desses conteúdos, em colapsos futuros. O desconhecimento das causas desse comportamento pode levar a patologias corporais e psíquicas, a exemplo das neuroses.”

“Muitas de nossas experiências transpessoais são (também) influenciadas por certos temas reprimidos contidos no inconsciente coletivo…” “… podem também dar origem a patologias”.

O desenvolvimento interior do homem consiste em libertar-se das limitações que o ego veio construindo nesta vida, consiste numa perene atenção à ilusão de separatividade, numa perene vigilância à propensão a pensamentos, emoções e atos ditados pelos seus registros de memórias passadas. 


Goswami entende que a verdadeira ilusão (maya) não é propriamente a realidade do homem e do mundo, e sim a ilusão da separatividade com que o homem percebe a realidade. 

Goswami diz que o desenvolvimento do homem está sintetizado na máxima “opto, ergo sum”, o que o caracteriza como ser humano é a capacidade, a determinação e a coragem da escolha, não é a capacidade intelectiva apenas. Goswami substitui a máxima “cogito, ergo sum”.

Para optar é preciso conquistar a liberdade interior. Os atos de livre arbítrio só existem se o homem se descondicionar e o processo passa por um processo de obtenção de uma auto consciência ampliada de si.

Quanto maior a tendência do sujeito em ceder ao automatismo das respostas aprendidas, menor é a oportunidade que ele dará à ocorrência de novos insights advindos da interferência da Consciência unitiva em futuras experiências, em futuros colapsos do sistema cérebro-mente. São estes insights que dão o prazer da criatividade ao homem, a possibilidade do novo, eles transmitem o sentido de unidade com o Universo, de Universalidade, de Amor.

O homem evolui acessando a Consciência Unitiva, potencialmente compatível com o processo de funcionamento do seu sistema cérebro-mente, no instante em que ele observa a realidade, desde que se abra para novas percepções, o que demanda vitalidade, liberdade interior, desapego de emoções compulsivas de hábitos, tabus, crenças, demanda ainda fé e esperança.

A evolução lhe permite atuar como co-criador da harmonia universal.
 Goswami é de opinião de que a expansão de autoconsciência individual implica na transformação harmonizadora dos vários níveis vibratórios que constituem o ser humano: seu corpo físico, seu “corpo” vital (de natureza psíquico-corporal) e o “corpo” mental.

Nesse sentido ele diz que tanto a contribuição da filosofia como da psicologia e do yoga são importantes: “a filosofia sem a psicologia e o yoga não dá frutos, a psicologia e o yoga sem a filosofia não têm raízes”.

A meditação é considerada essencial. Seu papel na nossa capacitação para exercer o livre arbítrio, Goswami escreve em seu livro (1), na pg 244: “Pela meditação ocorre a concentração da atenção no campo de percepção e num dado objeto da mente (objetos da mente são pensamentos e imagens).

Isso nos permite ser testemunhas dos fenômenos mentais que surgem na nossa percepção, testemunhas do desfile de pensamentos e de sentimentos que emergem, atrelados a condicionamentos anteriores.

A meditação cria um hiato entre o despertar de respostas mentais aqui-agora e a ânsia de agir de acordo com respostas antigas. 

Assim a meditação reforça a capacidade de nosso livre arbítrio no sentido de dizer não a atos condicionados.

É grande o valor desse esforço, em mudar comportamentos destrutivos usuais.”

Mais adiante na pg 282 do mesmo livro:”A meditação é o único método de criatividade interior, ela permite aprender a manter-se em estado de atenção, a praticar o desapego, a agir como testemunha do melodrama contínuo dos padrões de pensamentos”. Como demonstrado neste texto, a exploração da mente no âmbito do modelo quântico abre fronteiras para pesquisas científicas de alto interesse para a psicologia transpessoal. Por outro lado, permite à psicologia transpessoal contribuir para a evolução científica, não só da psicologia e da filosofia, como da física quântica, da neurologia e de outros campos científicos.

O diálogo da ciência, com as filosofias espiritualistas e com a psicologia transpessoal está em curso.

 
BIBLIOGRAFIA

(1) Goswami, Amit et alii: O Universo Auto Consciente como a consciência cria o mundo material; Ed. Rosa dos Tempos, 1998

(2) Goswami, Amit e Maggie: Spirituality a Quantum Integration; Science and Ed. Quick Prints 1997, New Delli

(3) Wollner, Laiz Moura: Quântica Taoista, Holográfica: a nova percepção da realidade (texto inédito)

(4) Tallbot, Michael: O Universo Holográfico: Ed. Best Seller, S. Paulo, 1991.

(5) Anotações pessoais de Maristela André, de Seminários do prof. Amit Goswami (cerca de 16 hs de duração cada): Ciência e Espiritualidade, VI Congresso Holístico e Transpessoal Internacional, set/1997 (Águas de Lindóia, S.P.); Congresso Internacional de Física e Espiritualidade, no Vivekananda Kendra Yoga Research Foundation, India, jan/1998; Seminário ” O ser quântico: criatividade e saúde mental “, em Airuóca, MG, jn/1998.

A dança nossa de cada dia nos dai, hoje!

Autor: Michel Robin

Faço aqui um convite a observarmos os indivíduos de maneira geral em sua expressão cotidiana, em seu assim chamado “jeito de ser”- olhares, gestos, posturas, ritmos, forma de andar, respirar, falar e assim por diante. É possível traduzir esta expressão humana numa espécie de melodia que cada um de nós carrega consigo em forma de uma “dança” particular, própria, através da qual somos muito mais reconhecido do que por nossos traços anatômicos. Este reconhecimento se dá certamente com mais clareza pelos que nos cercam do que por nós mesmos, é assim …



Este “jeito de ser” é, em outros termos, a expressão de nossa psique, revelam os esforços de administrar os anseios da alma. É uma forma concreta, tangível de “ver”, “ouvir” e “tocar” o interior de cada um.


Nossos olhos são contemplados diariamente por “danças” como a dança do “bonzinho”, a dança do “arrogante”, do “lamentador”, do “irado”, do “sedutor” e por aí vai. Podemos mesmo estender a observação a grupos inteiros, deleitando-nos com as danças dos advogados, políticos, médicos, professores, cada um com sua melodia. Há ainda a dos jovens, a dos velhos, dos motoqueiros, dos punks e patricinhas, enfim divirtam-se … É inevitável, estamos todos dançando. Na nossa grande maioria, ouvindo velhas e repetidas melodias que habitam nosso interior. Isto seria apenas divertido, se tivéssemos consciência deste evento e pudéssemos optar por dançá-las ou não, mas é óbvio que não é este o caso. Estamos todos adormecidos e impregnados pela inércia do cotidiano. A esta altura é interessante ressaltar dois pontos. O primeiro, que os dançarinos profissionais estão tão sujeitos a inconsciência quanto qualquer indivíduo ou grupo profissional, e o segundo é a exceção a regra, que são as crianças (até por volta dos sete) em geral; maravilhosos dançarinos.



Existem no entanto alguns raros momentos, quando por um motivo extraordinário somos arrancados da monotonia das bolorentas melodias e suas respectivas danças e … despertamos. Isto pode se dar as vezes por uma paixão, as vezes por uma desgraça, grande medo, infinita alegria, ou mesmo inexplicavelmente. Nestes preciosos instantes somos transformados em dançarinos de uma melodia nova momentaneamente escutamos a Melodia Presente, a melodia que está tocando de fato, seja em volta ou dentro de nós mesmos. Por algum tempo, neste estado tornamo-nos estranhos, diferentes, irreconhecíveis. Nestes estados mudamos nossos gestos, olhares, tons de voz, nosso ritmo, respiração e consequentemente vemos o mundo com outros olhos, ganhamos algo de novo. Parece ser algo ansiosamente desejado: mudar. Mas quantos de nós carregamos lá dentro o desejo de “que as coisas mudem mas que tudo continue da mesma forma?” Não queremos perder nada, e sobre tudo, não queremos perder o controle das coisas e de nós mesmo. São portanto estes momentos extraordinários, evitados e temidos, também pelo fato de que aprendemos a nos identificar e reconhecer através das sensações, sentimentos e pensamentos proporcionados pelo conhecido e repetido.



O mundo, ironicamente, atravessa um momento peculiar, em que todas as circunstâncias, econômicas, ideológicas, sociais e institucionais, parecem conspirar para derrubar-nos de nossas posturas e melodias costumeiras e danças que já sabemos dançar. Nos damos conta estupefatos de que muitas de nossas danças não servem mais. Mas nossa inércia é ditadora, e brigamos para fazer tudo voltar à Sinfonia Antiga ou, na impossibilidade de volta, nos faz querer encontrar uma nova dança, e rapidamente fixá-la. Queremos “a solução” para podermos adormecer deitados sobre ela até o próximo despertar.



É possível viver desta maneira, ao sabor da chegada e partida destes momentos extraordinários. É assim que tem sido, assim viveram nossos pais e avós e temos dado como certa e inevitável esta maneira de viver.


Podemos no entanto desejar outra coisa: tornamo-nos dançarinos. Significa desejarmos estar despertos, significa desenvolvermos uma atenção maior, uma permeabilidade e flexibilidade maiores, uma capacidade de pensar, sentir e agir mais integradas, principalmente uma capacidade de ouvir a melodia presente. Ter o corpo físico e a psique aptos a dançar novas danças. Significa neste caso admitir que temos sido prisioneiros de nossas melodias e danças e desejar encontrar alguma saída, e encontrar saídas requer sempre saber aonde estamos. Além disto é preciso lutar contra a tentação do sono, de cairmos na repetição mecânica de nossas danças, portanto é necessário que nos associemos a outras pessoas que partilhem do mesmo desejo de manter-se desperto. Quando um adormecer, o outro, que estiver mais desperto, poderá nos acordar dizendo talvez: “Olha você não está ouvindo a melodia presente, você está dançando algum eco do passado”. É um momento delicado que muitas vezes nos enfurece, e que nos incita a apelar para todas as justificações de que “Não é bem assim”, e portanto requer paciência e pessoas em que confiar. Em suma, significa desejar, e aceitar, ser tirado para dançar com a Vida.


Podemos contemplar o fenômeno da dança como: uma habilidade e ou graciosidade de movimentos; um instrumento de integração social; um acontecimento artístico; um elemento que permite aliviar tensões; uma expressão folclórica; ou mesmo um elemento religioso (de religação); todos eles circunscritos a momentos especiais. No entanto, vejo a dança como algo a ser conjugado cotidianamente com todas as nossas células. Creio que a Dança é o propósito último humano, e expressão de sabedoria: Poder estar presente diante de cada momento, reverencia-lo porque único, escuta-lo e, na condição magnífica de ser humano, Dança-lo …. Amém.

Educação emocional

Autor: Michel Robin

“…sem lidar com o campo afetivo, continuaremos a oferecer ao mundo indivíduos fixados em padrões infantis de comportamento, sentimento e pensamento, e certamente não seremos capazes de atingir a meta de educar pessoas para a plenitude do crescimento”. 

Claudio Naranjo psicanalista Chileno.

O conhecimento acadêmico, os diplomas, os certificados, mestrados, doutorados, pós-graduações, têm sido desejados, cultuados, enaltecidos respeitados e reverenciados já que têm sido usados como medida da capacidade profissional e portanto servindo como instrumentos para alcançar o assim chamado êxito. É uma corrida com uma enorme ênfase no processo competitivo. É algo que se faz para destacar-se dos demais, torna-se portanto uma opção solitária, uma exaltação da individualidade. Por outro lado, o desenvolvimento da área emocional, do conhecimento de si mesmo, da percepção mais clara das sensações, dos sentimentos e expressão de si é matéria de pouco investimento por parte de um profissional. Nossa educação e cultura certamente não valorizam este aspecto. De qualquer modo, não vem sendo da competência do sistema educacional encarregar-se da educação global, emocional dos indivíduos. É um aspecto que tem sido entregue à sorte.

O desenvolvimento da afetividade, da educação emocional, leva o indivíduo a perceber sua interligação com os demais. Leva-o a render-se ao fato que as relações interpessoais são o tecido sobre o qual repousa toda atuação de um profissional, e que não existe um ganhar real as custas de que outros saiam perdendo. Em suma, o bem estar do outro traz o bem estar real ao indivíduo. O verdadeiro ganho vem com o ganho de todos.

Observando nossa estrutura social percebe-se que a mesma propicia o desenvolvimento de uma liberdade mental, que permite chegar a brilhantes raciocínios, enunciados e deduções lógicas. Porém, de modo geral, podemos dizer que emocionalmente vivemos aprisionados e sub desenvolvidos, de tal maneira que, por exemplo, a presença ou ausência de uma palavra, um gesto, um olhar, dirigido a nós, pode nos acinzentar o dia, deixar-nos deprimidos, frágeis, e algumas vezes incapazes de discernimentos claros. Podemos consumir enormes somas de energia em pensamentos de revide e justificativas, tornando-nos temporariamente incapacitados. Em termos emocionais podemos dizer que somos enormemente imaturos. Assim, temos que nos render ao fato de que somos quase todos carentes de desenvolvimento emocional.

Aprendemos e nos tornamos “experts” em esconder nossas dificuldades, em disfarçar (e freqüentemente acreditar em nossos disfarces perdendo de vista nossas autênticas emoções e sensações) sob formas de brilhantes argumentações intelectuais ou em posturas politicamente corretas. Por outro lado quando algum distúrbio emocional ou afetivo se expressa de forma aguda, ou torna-se incomodamente crônico, delegamos ao campo chamado “terapia” a busca por soluções. Esta tem sido a maneira como socialmente temos tratado o problema. 

Aceitando nossa deficiência no campo do desenvolvimento emocional, podemos e devemos enfrentar esta lacuna com instrumentos específicos, deixando de lidar com o problema como sendo somente do “âmbito da terapia”ou “coisa de gente doente”, ou ainda de “pessoas e grupos problemáticos”. É possível, introduzir, se não na educação como um todo (o que seria o mais desejável), ao menos no treinamento de profissionais, algumas técnicas e/ou subsídios que permitam o desenvolvimento de seus aspectos sensíveis e emocionais. Ou como diz Claudio Naranjo, psicanalista chileno, “Longe de ser um luxo, uma nova educação – Uma educação da pessoa como um todo para um mundo como um todo – é uma necessidade urgente e nossa maior esperança, pois todos nossos problemas seriam totalmente simplificados se primeiro alcançássemos a verdadeira sanidade e a capacidade para amar, que é uma parte dela. A paz individual é a base da paz mundial “.

Estamos falando de educação emocional, e o primeiro passo nesta direção é o reconhecimento da necessidade de ampliar o universo sensível, emocional e expressivo de profissionais de qualquer área de atuação, no entanto, é imprescindível que aqueles que atendem pessoas, possam manter um contato mínimo consigo mesmos. Que estes possam reconhecer que por vezes suas perturbações emocionais podem poluir gravemente suas percepções e relações pessoais, seja com colegas ou com as pessoas a serem atendidas.

(Quem já se sentiu frágil, e necessitando ajuda, sabe que naquele momento não se quer ao lado brilhos intelectuais e sim alguém que acolha e compreenda. Porem, somos tão bem treinados para aparentarmos constantemente competência e independência e “nunca precisar” de nada nem ninguém ……… )

A Prática

O mundo emocional não é como se supõe a primeira vista algo invisível aos olhos ou aos sentidos. Se expressa o tempo todo, nos olhares, andares, ritmos, gestos, respirações, posturas, tons e timbres de voz, para citar alguns elementos. O que chama atenção é que todos nós temos um jeito, uma forma psicofísica de estar, que torna-se a marca de cada um. Reconhecemo-nos e somos reconhecidos por este jeito. Somos “imitáveis” Isto significa que somos prisioneiros desse nosso jeito, de nosso repertório, da forma de receber, processar, absorver e responder ao mundo.

Trabalha-se………. expondo-se. Muitas vezes não queremos mexer em nós mesmos pois achamos que não seremos capazes de mudar, ou que mudanças trarão sempre sofrimentos, e assim nos retraímos e desistimos de entrar nesta área. Em nosso processo, não se trata de abolir o medo, mas de reconhecer a nossa humanidade, aceitar nossa pouca capacidade de manejo com emoções, reconhecer nossa necessidade de crescimento, e que temos pouca mobilidade e/ou flexibilidade e um repertório restrito. É necessário desejar mexer conosco, ampliar-nos como seres humanos, desejar sair de onde estamos, dos lugares já conhecidos, sem abolir o medo. Ao mexermos em aspectos internos nossos é importante e necessário incentivar a esperança de transformar, de crescer em outras áreas além do intelecto.

O trabalho que propomos é realizado basicamente através do movimento corporal, ou seja de exercícios onde os participantes são levados a se movimentarem em diferentes ritmos, posturas e gestos, com amplitudes não habituais, utilizando a voz, ao som de músicas variadas – eruditas, populares e folclóricas. A música impele os indivíduos a vivenciarem uma ampla gama de emoções. Os exercícios são propostos, freqüentemente, através da imitação de um instrutor. Isto evita as interpretações intelectuais, confere maior liberdade aos participantes(sic) já que os mesmos terão oportunidade de sair de seus respectivos repertórios de movimento entregando a responsabilidade pelos movimentos ao instrutor, além de, como um todo, exercitar sua capacidade de entrega. Realizar estes exercícios em grupo permite que os indivíduos possam aproveitar-se da energia grupal para ir além do que normalmente fariam numa proposta individual. Permite também exporem-se uns diante dos outros, atravessando a fronteira da retórica dos discursos apenas verbais. É posto um enfoque especial a que os participantes surpreendam-se consigo mesmos, ou seja: observem-se, percebam e permitam que deles brotem gestos e posturas, que sejam instrumento de revelação de si mesmos. Que se conheçam verdadeiramente. É somente sabendo onde estamos que podemos ir para outro lugar, mudar, transformar

Livros Indicados

"Del Cuerpo hacia la Luz - 45 años del Sistema Río Abierto"

Maria Adela Palcos Editora Kier - 2011 - Buenos Aires

“O Corpo em Conexão: Sistema Rio Aberto”

Laura Pozzana de Barros Editora da Universidade Federal Fluminense – EdUFF – Niterói – 2008

“La Vida en Movimiento – el Sistema Río Abierto. Sanar los bloqueos emocionales”

Vincenzo Rossi Editora Kier – Buenos Aires - 2006

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