Textos de referência

Breve descrição sobre o trabalho que realizamos – Parte 2

* Este texto está dividido em duas partes)
Autora: Maria Adela Palcos

2. Massagens

São indicadas para ajudar a destravar zonas que uma pessoa não consegue, por si mesmo, mobilizar ou destravar na ginástica-harmônica (também são feitas por indicação médica, para melhoria de problemas orgânicos ou posturais).  São aplicadas, geralmente, por um ou mais instrutores, que se utilizam das mãos, pés, cotovelos, etc., porém sempre usando o corpo com um balanço que ajuda a gerar e descarregar energia. São utilizados, enquanto se massageia, certos ritmos respiratórios; às vezes, respirando, massagista e massageado, no mesmo ritmo, pois isto ajuda a aumentar a concentração e a unificar a intenção de quem dá e de quem recebe a massagem. Também fazemos uso da voz, emitindo sons relacionados com a zona que se está manipulando e, quem recebe a massagem é estimulado a se expressar pela voz, gestos, palavras ou movimentos.  Suas principais funções são:  

2.1. Relaxante

2.2. Circulatória do sangue e da energia, uma vez que esta tende a fluir das regiões de menor para as de maior carga, de maneira que as regiões travadas ou couraças musculares tendem a concentrar cada vez mais energia e precisamos ajudar a pessoa a mudar este círculo vicioso. É interessante, nesta altura, inserir o relato de uma experiência, feito nos seguintes termos:  ” Sofri durante muitos anos de enxaqueca, com duração de até 15 dias. Tinha algum alívio com massagens e exercícios físicos, porém não conseguia o desaparecimento total dos efeitos da enxaqueca. Certo dia, sentindo muita dor, fui ao Instituto como de costume. Sofria dores do occipital até a parte superior da cabeça, afetando os seios da face e a cavidade dos olhos. A dor chegava até a garganta. Generalizada desta forma, me produzia náuseas e mal estar insuportáveis. Maria Adela sentou-me em uma mesa de massagem e tratou de relaxar-me ao máximo; quando considerou que estava em condições de atuar aplicou com a borda da mão (tipo karatê) um golpe na altura dos olhos que “valha-me Deus”. Reagi de imediato e violentamente, dado que a dor foi terrível e de surpresa; nesse instante a dor espantosa despertou em mim uma violenta reação, com um instinto assassino e ódio indescritíveis. Para terminar, depois de transcorridos aproximadamente 2 anos, tenho a satisfação de confessar que a enfermidade nunca mais se repetiu.”  

Outras funções da massagem são: 

2.3. Corretiva postural, já que o nosso trabalho tem como uma de suas finalidades ajudar o ser humano a colocar-se de pé com toda sua verticalidade, para que possa realizar-se nele a síntese dos dois tipos de energia que o sustentam: a que vem da terra e a que vem do sol. Para tanto, trabalhamos, fundamentalmente, as articulações. 

2.4. Conscientizadora: a massagem contribui muito para a tomada de consciência de zonas não reconhecidas do próprio corpo e, também, de fatos passados que têm relação com a formação das travas e que vêem a lembrança (com todo conteúdo emocional que possuíam) no momento que se está manipulando a região correspondente no corpo. A experiência a seguir, pode ser explicativa do que dissemos: “Um dia recebi uma massagem grupal que remexeu coisas da minha infância. Eu estava deitada na mesa de massagem e Diana, que aplicava a massagem, separava o peitoral maior dos deltóides, na região da clavícula. Dentro de mim começou uma revolução entre minhas distintas partes, que conversavam assim:

– Bem, o que se propõe Diana a fazer comigo?

– Eu tenho razões para estar assim (“assim”, era que, por ter os músculos curtos, o braço ia para dentro, ocupando o lugar do peito). Imediatamente, veio a imagem de meu pai que me chamava de “mula” quando era pequena. Nesse momento enfrentei a “mula” e recordei porque me vinha esta imagem. Meu pai queria que eu preparasse o café de manhã e eu não tinha vontade; como sua autoridade era forte, finalmente o fazia, mas com uma “mula” interna que me acompanhava quase que permanentemente. A seguir, me atacou uma tosse profunda que parecia desenraizar, fisicamente, o que acabara de ocorrer psicologicamente; levantei-me e fui a pia cuspir. Ao voltar, Diana se pôs em meu caminho. Isto me molestava. Mas não era com ela com quem eu queria brigar. Era com meu pai.  Então se aproximou Jorge e se fez passar por meu pai e sucedeu o seguinte diálogo:

– Faça o café.

– Não quero, por acaso os meninos não podem fazê-lo?

– Você é a mulher da casa.
– Por que eu? Faça você.

– Eu trabalho o dia todo.

– E eu estudo.

– Você estuda para você.

– E quem quis que eu estudasse?

O diálogo teria sido interminável, porque Jorge prontamente exclamou:

– Como é que eu faço se você não é uma “mula”!

Isso me fez parar e passar por um instante para o lugar dele. Quem sabe, ele poderia comunicar-se comigo somente até aí, até a mula. E de imediato compreendi, e abraçada a Irene dizia:

– Papai….. papai….. eu quero o meu papai.”

Outra função da massagem pode ser: 

2.5. De reconexão consigo mesmo e com o meio circundante. Às vezes, por um trauma psíquico, a pessoa fecha seus circuitos energéticos, guardando sua sensibilidade lá no fundo, ficando ilhada de si mesmo e do que a rodeia. Nestes casos são utilizadas certas manobras para trazer o indivíduo ao seu centro.

3. Dramatização 

É outra das técnicas utilizadas em nosso trabalho e que se provou muito útil quando a verbalização é necessária, e quando se requer uma linha argumentativa (verdadeira ou fictícia) para o desenvolvimento e elaboração adequados de um personagem. É usada separada, ou combinadamente, com alguns dos outros instrumentos analisados. Por exemplo: em um grupo de ginástica harmônica; em continuação da massagem (como um dos casos relatados), etc.

Utilizamos, também, o trabalho que denominamos de pares de opostos, ou seja desenvolver a postura e a fala correspondentes à generosidade e, a seguir, ir para à mesquinhez; a bondade e a maldade; o brando e o rígido; o conservador e o inovador, etc. Também a conversa entre os diferentes personagens de uma pessoa e muitas outras técnicas que não detalharei, uma vez que as técnicas dramáticas são bastante conhecidas no nosso meio. Mencionarei, somente, a técnica “quem sou eu”, porque considero que ajuda a alcançar zonas mais profundas. Deve ser aplicada em um estado de profundo relaxamento do indivíduo, do grupo que o rodeia e do coordenador, do qual é requerido conhecer a experiência por ter passado por ela, para poder acompanhar a viagem interior que acontece e ajudar, se necessário, na exteriorização que a própria pessoa não consiga realizar.

4. Trabalho com a voz

Voz é comunicação, é intercâmbio entre o mundo interno e o externo. Desarticulada é expressão, articulada é palavra. Qualquer inibição e/ou interferência no canal de comunicação manifesta-se na voz, nos órgãos e nos músculos que tomam parte da emissão sonora: aparelho respiratório, pescoço, garganta e rosto. A trava vocal é trabalhada a partir do corporal e do psíquico. A partir do corporal, corrigindo a postura e a respiração, mobilizando e relaxando a musculatura do pescoço e do rosto; a partir do psíquico, liberando as comportas que controlam o livre fluir das emoções. Gritar, grunhir, balbuciar, gemer, uivar, inclusive cantar são formas de expressão proibidas para a maioria das pessoas, uma vez que só são aceitos, culturalmente, os tons médios, sem estridência (“nenê, não grite”, “não fale tão alto”, “vai cantar no chuveiro”, etc.). A emissão destes “ruídos” desperta, atualiza e libera conteúdos psíquicos inibidos, permitindo uma profunda transformação energética:

grito canto

som

ruído palavra


com a qual se alcança uma completa descarga, transformação e reincorporação de energia. 

5. Plástica

Um grande número de pessoas sente-se inibida em mergulhar no mundo da arte, impedindo o enriquecimento da sensibilidade e sua aplicação em suas ocupações. Todavia, o processo de liberação artística é um meio de auto-expressão. O encontro com e a viabilização da auto expressão, liberam energia e facilitam nosso desenvolvimento e crescimento futuro. Cada área de nossa vida pode-se converter em um meio para o crescimento. A busca artística está orientada para investigar o caminho que vai da experimentação essencial-corporal-dramática, até a criação de um fato artístico. Pintar, modelar, martelar, recortar diversos materiais, texturas, cores, odores, com possibilidades de expressão que possam ser registradas em um papel, na argila, madeira, permitem à pessoa recordar-se e ver-se objetivamente, elaborando e melhorando seu mundo interior. 

6. O trabalho sobre si – dinâmica grupal

Denominamos “Trabalho sobre Si” o trabalho que tem por objetivo fundamental o reencontro de um ser com seu Eu – profundo, ou Eu – essencial. Para um melhor desenvolvimento em direção a este objetivo atuamos em três áreas, cujas interrelações facilitam a vivência integral do indivíduo. Estas áreas são: física, psíquica e espiritual. Partimos do corpo e, por meio da ginástica-harmônica, propomos o contato com áreas desconhecidas da nossa personalidade, a expressão e a conscientização das travas físicas e suas equivalentes psíquicas-emocionais, a liberação e elaboração da energia retida em zonas de conflito que provocam dor, tensão e até enfermidade.
Em outro nível, os exercícios baseados na yoga – como respiração, relaxamento, movimentos à partir dos centros de energia, meditação e outras técnicas – permitem-nos o reencontro com a nossa dimensão interior mais profunda. O trabalho sobre si é voltado para o desenvolvimento harmônico do ser humano e é a base tanto dos grupos gerais como dos grupos fechados e dos atendimentos individuais, adaptando-se aos níveis e necessidades dos grupos ou pessoas que participam de cada atividade. 

7. Meditação 


O que, habitualmente, conhecemos como meditação é a prática de diferentes técnicas que têm por objetivo o reencontro do ser humano com seu Eu – Profundo. Dito de outra maneira: o ego liberto na essência. Contudo, é necessário distinguir entre as “técnicas” e a “meditação”. 

A meditação não é um “chegar a”, mas sim uma “atitude”, uma “postura interior”, uma “modalidade de ser”. Esta “atitude” transforma tudo o que alcança, fazendo da vida cotidiana uma “celebração da existência”.

O objetivo então não é meditar, mas desenvolver a Presença, estar no mundo sabendo que Eu Sou e Sou uma manifestação do Ser Universal. Cremos que cada técnica abre uma porta e que é na prática que cada pessoa encontra o melhor caminho para si mesmo. 

A prática da meditação possibilita também:

– a profunda relação psicofísica,
– maior equilíbrio emocional,
– maior capacidade de concentração,
– maior receptividade, 
– compreensão mais profunda e abrangente de situações de conflito,
– uso positivo da energia, 
– acesso a outros níveis de consciência 

8. Diversos trabalhos manuais 

O que foi descrito quanto à plástica pode estender-se a este item, incorporando às tarefas plásticas-expressivas, aquelas que implicam numa mudança de papel na sociedade, por exemplo: tarefas de alvenaria, carpintaria; trabalhos com a terra; etc. 

9. Convivências em contato com a natureza

Estas jornadas podem durar de um a sete dias e são realizadas fora da cidade e/ou na Cordilheira [dos Andes]. Nossos principais objetivos são: 

– aprofundar as relações interpessoais de um grupo ou de uma classe,
– vivificar relações espaço-corpo, distintas daquelas que se vive nas cidades; 
– reconhecer a posição do ser humano no planeta e no cosmos, etc. 

Temos percebido que estas jornadas ajudam a desbloquear os aspectos mecânicos da personalidade e, em conseqüência, as raízes essenciais do indivíduo buscam sua manifestação.
 
10. Hiperventilação

Nós, seres humanos, percebemos a realidade e organizamos uma visão cósmica a partir de um determinado ponto de vista, o qual privilegiamos. 

A partir daí, aprendemos a responder a essa realidade, sem nos darmos conta que essa visão cósmica, a partir da qual operamos, é tão somente um ponto de vista. Esse erro de percepção faz com que nos identifiquemos com alguns aspectos da nossa personalidade e neguemos outros, com o conseqüente empobrecimento da nossa capacidade de resposta e de nosso potencial criativo. Ainda assim o ser humano escolhe (tem) padrões de conduta, voluntária e inconscientemente, que tende a repetir, sem atentar para as mudanças das circunstâncias que o rodeiam. Estes padrões repetitivos são denominados mecanicismos. 

Na Hiperventilação, pela manutenção de um padrão de respiração modificado em relação ao natural, é produzida um alteração do ponto de vista (padrão de percepção) com que nos identificamos, para focar a atenção desde o Eu-Respirador-Contemplador. Desta maneira, revivenciamos, catarticamente, diversas situações, tanto da biografia pessoal, como de níveis mais amplos do Ser, com a intenção de perceber o processo vital, antes mesmo de identificar-nos com um “projeto de vida”, concebido a partir de um estado de ânimo cristalizado. 

A experiência da hiperventilação é uma Unidade de tempo e espaço, onde deixamos de cuidar do que “está fora” e, para tanto, usamos como catalisadores a respiração e sua mudança de padrão, músicas evocativas e a energia grupal. 

Com que tipo de pessoas trabalhamos

Freqüentam o Rio Abierto todos os tipos de pessoas, com objetivos os mais diversos. Há os que procuram emagrecimento ou modelagem do corpo, mover-se, agilizar-se, expressar-se; os que vêem por problemas respiratórios, posturais, etc. e outros cuja finalidade é uma busca mais profunda. 

Estes últimos passam a participar de grupos de trabalho intensivo, nos quais se aplicam as técnicas anteriormente descritas, além de outros elementos: tarefas de alvenaria, trabalho com a terra ou similares, que ajudam a desfazer mecanicismos ou condicionamentos sociais, há muito arraigados nos indivíduos. São organizadas, também, atividades de convivência grupal, que são muito enriquecedoras e contribuem para criar vínculos muito estreitos entre os participantes.

Um dos lemas, tanto nestes grupos como no grupo de instrutores, é “ajudar, ajudando-se”, porque pudemos comprovar que isto produz uma transitividade nos trabalhos, uma projeção em relação ao outro daquilo que faço muito benéfica para superar as próprias limitações. Também vai desenvolvendo os níveis do ser humano, mencionados como centro emocional superior e centro mental superior, que são aqueles encarregados de aproximar-nos da verdadeira percepção da unidade, que está além do nível pessoal e só é percebida como uma conjunção com o todo.

Faltaram ser comentados vários aspectos do nosso trabalho, como por exemplo: que ele está enraizado, desde seu início, nos autóctones americanos, uma força à qual nos sentimos estreitamente unidos; que ele baseia-se em alguns princípios de yoga e de outras disciplinas orientais e, também, em elementos da cultura grega, tais como as plásticas apolínea e dionisíaca, às quais se acrescenta a orientalista (sobre estas, para não estender demasiadamente este texto, deixo de fazer quaisquer descrições). 

O nosso sistema, parece-me útil registrar, é sem esquemas fixos, uma vez que valorizamos especialmente a mobilidade, a não fixação; desta maneira, quem dirige o grupo de ginástica-harmônica ou outra atividade, escolhe livremente os exercícios ou manipulações que irá realizar, de acordo com sua percepção e a daqueles para quem a prática se orienta.

Com isto, dou por encerradas estas notas, escritas com a colaboração de pessoas que participam do Rio Abierto, e que trouxeram, também, breves descrições de suas experiências pessoais. 

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