Autora: Maristela A. André
Observação: Este texto está dividido em três partes! Confira as demais partes.
Maristela A André, S Paulo (revisto em maio/2001)
ÍNDICE
1. INTRODUÇÃO
2. A TEORIA DA INCERTEZA
3. O OBSERVADOR E O OBJETO OBSERVADO (ver parte 2 do texto)
4. A CAUSAÇÃO DESCENDENTE (ver parte 2 do texto)
5. O MUNDO QUÂNTICO DA MENTE (ver parte 3 do texto)
5. O MUNDO QUÂNTICO DA MENTE
A consciência individual é egóica*, por ela a pessoa identifica a si mesma como única e ilusoriamente se percebe como ente separado do universo. Ela é a projeção da Consciência Universal na dimensão individual do homem.
Quando a atenção consciente do homem, num experimento de física quântica, provoca o colapso da onda de probabilidades (realidade potencial) em partícula (realidade imanente), o homem escolhe um resultado para a medição (partícula), mas permanece inconsciente de que de fato fez uma escolha e é inconsciente da sua interdependência em relação ao objeto observado.
É a Consciência Unitiva que atua sobre o sistema cérebro-mente do homem e produz o colapso onda-partícula e a consciência individual interpreta o resultado dessa intervenção, com base no seu sistema de representações que é apenas um mapa limitado e não a própria realidade. A realidade externa parece ser concreta, sólida e independente dele, o que é uma ilusão, maya, na filosofia Vedanta.
A Consciência Una momentaneamente se identifica com a do sujeito observador, o que provoca nele a percepção de si como diferenciado do objeto observado, lhe dando a sensação de “eu existo” como ente autônomo, ignorando a interdependência em que se encontra. A ilusão de separatividade dá ao homem o sentido de “ego” *, conceito cunhado por Freud. Percebe-se como separado do objeto observado, do mundo ao redor. Ainda neste texto veremos como o homem evolui no sentido de sair dessa ilusão de separatividade, adquirindo consciência de sua integração num universo interdependente e holográfico (em que as partes são o todo, o todo é as partes).
Segundo Goswami, se não houvesse a intervenção da Consciência, agente externo ao sistema (observador-objeto observado), não haveria colapso da onda em partícula, não haveria medição, pois o sistema cérebro-mente, dual, é parcialmente clássico (mensuralidade é qualidade da física clássica) e parcialmente quântico (capaz de descontinuidade, de salto quântico), mas é um sistema emaranhado ou entrelaçado, de resolução lógica impossível.
Um sistema entrelaçado ou emaranhado é sempre paradoxal, está condenado a uma perene retro alimentação, a exemplo da frase “eu sou mentiroso”. Ao buscarmos o significado da frase vemos que o sujeito define o objeto, mas não nos permite uma conclusão pois o objeto, por sua vez, redefine o sujeito. Outro exemplo de sistema entrelaçado é o do desenho de M. C. Escher de duas mãos pintando simultaneamente uma à outra. Quem pinta quem?
Dentro do quadro o sujeito (a 1a mão) recria o objeto (a 2a mão) e este cria o sujeito. A solução do paradoxo está fora do sistema, é Escher, o pintor, que pinta a ambas. Segundo Amit Goswami, tal fenômeno ocorre também no sistema interativo cérebro-mente. Sem a medição (pelo cérebro), o sistema não existe e sem a percepção atenta (pela mente) também não. A Consciência Una cria o colapso no sistema cérebro-mente,dá a oportunidade da opção (realizada pela mente), do registro (no cérebro) e de sua interpretação (pela mente).
OS OBJETOS DA MENTE
Cientistas quânticos admitem que os “objetos da mente” tem as propriedades dos objetos quânticos. Objetos da mente são os pensamentos e as imagens aos quais a mente confere significados, sendo estes significados subjetivos. O valor dos objetos da mente é dado pelo significado subjetivo que a mente lhes atribui; tem o padrão comportamental de ondas de probabilidade.
Físicos admitem ser a realidade da mente continua, una, indivisível, holográfica e assim compatível com a percepção da realidade quântica, compatível com aquela atribuída à Consciência Universal, com a qual a mente pode se identificar, através da expansão da auto consciência, especialmente em estados de meditação.
Os pensamentos e imagens são experiências interiores, subjetivas, da mente. Tanto nos estados de vigília como nos de sonho os objetos de observação da mente existem e são relevantes.
A CONSCIÊNCIA INDIVIDUAL COMO CANAL DA CONSCIÊNCIA CÓSMICA
Examinemos mais detidamente como se dá a intervenção da Consciência Unitiva, criando os colapsos da realidade potencial para a imanente através da mente humana, veremos ainda a conseqüência disso sobre a Consciência individual.
Cada vez que ocorre uma experiência de colapso no sistema cérebro-mente, um registro de ocorrência acontece e fica impresso no sistema. Uma sucessão de registros vai constituindo a memória. Essa memória vai criando uma predisposição, um enrijecimento no sistema cérebro-mente. Desse modo perante um estimulo novo, com características animicamente semelhantes àqueles registrados na memória, o sistema tende a dar respostas semelhantes.
O conjunto de memórias acumuladas no sistema cérebro mente vai, ao longo do desenvolvimento histórico da criança ao adulto, construir o ente que Freud chamou de ego.
Ego é o ente pelo qual a pessoa identifica a si mesma como única e separada de qualquer outra pessoa e da natureza. Goswami se refere também ao ego como “a imagem que formamos do experienciador aparente de nossos atos, pensamentos e sentimentos no dia a dia”(pg 239 item 1 da bibliografia). Estas memórias criam formas e são guardadas no inconsciente individual (identificado por Freud) como também no inconsciente coletivo (identificado por Yung). Neles se encontram inclusive, memórias dolorosas e amedrontadoras que o ego procura reprimir.
Segundo Goswami (pág.245)1 ” se o sujeito é condicionado a evitar certos estados mentais, cria-se uma probabilidade esmagadora de que estes jamais sofram colapso, em novas experiências, porém os estados de ansiedade provocados pela restrição freqüentemente influenciam, sem causa aparente, a emergência desses conteúdos, em colapsos futuros. O desconhecimento das causas desse comportamento pode levar a patologias corporais e psíquicas, a exemplo das neuroses.”
“Muitas de nossas experiências transpessoais são (também) influenciadas por certos temas reprimidos contidos no inconsciente coletivo…” “… podem também dar origem a patologias”.
O desenvolvimento interior do homem consiste em libertar-se das limitações que o ego veio construindo nesta vida, consiste numa perene atenção à ilusão de separatividade, numa perene vigilância à propensão a pensamentos, emoções e atos ditados pelos seus registros de memórias passadas.
Goswami entende que a verdadeira ilusão (maya) não é propriamente a realidade do homem e do mundo, e sim a ilusão da separatividade com que o homem percebe a realidade.
Goswami diz que o desenvolvimento do homem está sintetizado na máxima “opto, ergo sum”, o que o caracteriza como ser humano é a capacidade, a determinação e a coragem da escolha, não é a capacidade intelectiva apenas. Goswami substitui a máxima “cogito, ergo sum”.
Para optar é preciso conquistar a liberdade interior. Os atos de livre arbítrio só existem se o homem se descondicionar e o processo passa por um processo de obtenção de uma auto consciência ampliada de si.
Quanto maior a tendência do sujeito em ceder ao automatismo das respostas aprendidas, menor é a oportunidade que ele dará à ocorrência de novos insights advindos da interferência da Consciência unitiva em futuras experiências, em futuros colapsos do sistema cérebro-mente. São estes insights que dão o prazer da criatividade ao homem, a possibilidade do novo, eles transmitem o sentido de unidade com o Universo, de Universalidade, de Amor.
O homem evolui acessando a Consciência Unitiva, potencialmente compatível com o processo de funcionamento do seu sistema cérebro-mente, no instante em que ele observa a realidade, desde que se abra para novas percepções, o que demanda vitalidade, liberdade interior, desapego de emoções compulsivas de hábitos, tabus, crenças, demanda ainda fé e esperança.
A evolução lhe permite atuar como co-criador da harmonia universal.
Goswami é de opinião de que a expansão de autoconsciência individual implica na transformação harmonizadora dos vários níveis vibratórios que constituem o ser humano: seu corpo físico, seu “corpo” vital (de natureza psíquico-corporal) e o “corpo” mental.
Nesse sentido ele diz que tanto a contribuição da filosofia como da psicologia e do yoga são importantes: “a filosofia sem a psicologia e o yoga não dá frutos, a psicologia e o yoga sem a filosofia não têm raízes”.
A meditação é considerada essencial. Seu papel na nossa capacitação para exercer o livre arbítrio, Goswami escreve em seu livro (1), na pg 244: “Pela meditação ocorre a concentração da atenção no campo de percepção e num dado objeto da mente (objetos da mente são pensamentos e imagens).
Isso nos permite ser testemunhas dos fenômenos mentais que surgem na nossa percepção, testemunhas do desfile de pensamentos e de sentimentos que emergem, atrelados a condicionamentos anteriores.
A meditação cria um hiato entre o despertar de respostas mentais aqui-agora e a ânsia de agir de acordo com respostas antigas.
Assim a meditação reforça a capacidade de nosso livre arbítrio no sentido de dizer não a atos condicionados.
É grande o valor desse esforço, em mudar comportamentos destrutivos usuais.”
Mais adiante na pg 282 do mesmo livro:”A meditação é o único método de criatividade interior, ela permite aprender a manter-se em estado de atenção, a praticar o desapego, a agir como testemunha do melodrama contínuo dos padrões de pensamentos”. Como demonstrado neste texto, a exploração da mente no âmbito do modelo quântico abre fronteiras para pesquisas científicas de alto interesse para a psicologia transpessoal. Por outro lado, permite à psicologia transpessoal contribuir para a evolução científica, não só da psicologia e da filosofia, como da física quântica, da neurologia e de outros campos científicos.
O diálogo da ciência, com as filosofias espiritualistas e com a psicologia transpessoal está em curso.
BIBLIOGRAFIA
(1) Goswami, Amit et alii: O Universo Auto Consciente como a consciência cria o mundo material; Ed. Rosa dos Tempos, 1998
(2) Goswami, Amit e Maggie: Spirituality a Quantum Integration; Science and Ed. Quick Prints 1997, New Delli
(3) Wollner, Laiz Moura: Quântica Taoista, Holográfica: a nova percepção da realidade (texto inédito)
(4) Tallbot, Michael: O Universo Holográfico: Ed. Best Seller, S. Paulo, 1991.
(5) Anotações pessoais de Maristela André, de Seminários do prof. Amit Goswami (cerca de 16 hs de duração cada): Ciência e Espiritualidade, VI Congresso Holístico e Transpessoal Internacional, set/1997 (Águas de Lindóia, S.P.); Congresso Internacional de Física e Espiritualidade, no Vivekananda Kendra Yoga Research Foundation, India, jan/1998; Seminário ” O ser quântico: criatividade e saúde mental “, em Airuóca, MG, jn/1998.